A decisão põe fim a semanas de expectativa e marca o momento em que a nova legislação passa a ser oficial, após meses de debate político e jurídico. Segundo o próprio Presidente, a promulgação foi justificada por “corresponder minimamente ao essencial das dúvidas de inconstitucionalidade que foram suscitadas”.
Visto para empreendedorismo e startups: “Uma boa ideia que precisa sair do papel”
Um dos pontos mais celebrados é a criação formal de um visto para empreendedorismo e startups, que reconhece o segmento como estratégico para a economia portuguesa.
“É uma porta real para milhares de empreendedores brasileiros e estrangeiros que querem investir, inovar e gerar emprego em Portugal”, destaca o advogado.
“Mas é preciso alertar: o facto de existir na lei não significa que esteja operacional. O Governo deve regulamentar rapidamente este visto, sob pena de ser mais uma via bonita no papel e vazia na prática.”
Visto de trabalho qualificado: incertezas e definições em aberto
O visto de procura de trabalho passa agora a chamar-se visto de procura de trabalho qualificado, mas o texto legal deixa dúvidas sobre quem poderá usá-lo.
“A lei fala em ‘competências técnicas especializadas’, mas não define o que isso significa. Diz apenas que serão estabelecidas em portaria futura. Ou seja, hoje ninguém sabe quem poderá efetivamente candidatar-se”, explica Bicalho.
Essa indefinição, segundo o jurista, mantém a insegurança jurídica e pode criar desigualdades no acesso ao mercado de trabalho.
Reagrupamento familiar: “A Constituição protege a unidade familiar, não a separação”
No campo mais sensível — o humano —, o novo regime mantém a exigência de dois anos de residência para que um estrangeiro possa trazer a sua família, salvo exceções.
“Essa regra pode continuar a separar famílias, contrariando o princípio constitucional da unidade familiar”, alerta o advogado.
“A Constituição da República Portuguesa protege a família como núcleo fundamental da sociedade. Não estabelece tempos de separação.”
AIMA ganha mais tempo — e o imigrante perde
Outra alteração polêmica diz respeito aos prazos de decisão da AIMA (Agência para Integração, Migrações e Asilo).
O prazo, que antes era de três meses prorrogáveis por mais três, passa agora a nove meses prorrogáveis por mais nove, sem deferimento tácito.
“Isso significa que os processos podem arrastar-se até 18 meses sem resposta. Na prática, a nova regra institucionaliza a morosidade e transfere para o imigrante o ônus da lentidão do Estado”, critica Bicalho.
Acordos bilaterais para mão-de-obra estrangeira
A nova lei também autoriza o Governo a celebrar acordos bilaterais para importar trabalhadores de países específicos, sobretudo para setores com falta de mão-de-obra.
“Faz sentido do ponto de vista económico, mas há um paradoxo. Portugal quer recrutar mais trabalhadores no estrangeiro, enquanto dificulta a regularização de quem já está no país, trabalhando e contribuindo”, pontua o especialista.
Um apelo à coerência
Para o Dr. Wilson Bicalho, o desafio agora é fazer a lei funcionar de forma justa, humana e eficiente.
“Se o objetivo é uma imigração regulada e estratégica, não podemos continuar a criar leis que abrem portas com uma mão e fecham com a outra”, conclui.
“Portugal precisa de uma política migratória coerente, transparente e constitucionalmente responsável.”
Quem é Wilson Bicalho:
– Advogado e CEO da Bicalho Consultoria Legal em Portugal, Licenciado no Brasil e Portugal;
– Sócio na Bicalho Consultoria Legal em Portugal;
– Professor de Pós-Graduação em Direito Migratório;
– Pós-graduado em Lisboa pela Autónoma Academy de Lisboa;
– Sócio fundador das empresas portuguesas B2L Born to Link e RBA International.
Fonte: CM Press – Cláudia Moura