Durante quatro safras agrícolas (2017/2018, 2018/2019, 2019/2020 e 2020/2021), os pesquisadores avaliaram mais de 50 cultivares de soja em doze ensaios nos municípios de Campos e Macaé, localizados na região norte fluminense. Os resultados surpreenderam os cientistas e entusiasmaram o poder público. “No caso da soja, chegamos a obter 6,3 mil kg/ha na safra 2019/2020 no município de Macaé, quando a média nacional é de 3,3 mil kg/ha”, comenta Jerri Zilli, pesquisador da Embrapa Agrobiologia (RJ). Das cultivares testadas, dez apresentaram bons resultados e superaram a média nacional.
Após avaliar criteriosamente o desenvolvimento das cultivares, assim como as práticas e os sistemas de cultivo mais adequados, a conclusão dos pesquisadores é que existem cerca de 300 mil hectares com potencial para produção de soja na região norte fluminense. “No Rio de Janeiro, podemos dizer que a soja é uma cultura que se desenvolve bem, desde que plantada do jeito certo”, explica a pesquisadora da Embrapa Claudia Jantália.
A maneira certa, de acordo com os cientistas, são os sistemas conservacionistas, que utilizam práticas agrícolas de baixo impacto, como por exemplo o plantio direto. É preciso levar em conta que boa parte do solo da região está impactado e degradado tanto do ponto de vista da fertilidade quanto de processos erosivos. “Entendemos que o sistema de plantio direto e os sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF, foto ilustrativa abaixo) em suas diferentes modalidades são os mais adequados, especialmente para aproveitar a cultura da região na criação de bovinos”, argumenta Zilli.
Os pesquisadores ressaltam que o potencial do norte fluminense para o plantio de grãos (soja e milho) vai além do comportamento das cultivares no campo, pois eles consideram ainda fatores sociais, econômicos e a infraestrutura regional. “Paralelamente aos testes de cultivares, fizemos debates com diversas instituições e órgãos do estado no intuito de identificar oportunidades para ampliar a área de grãos no Rio de Janeiro, visando não só beneficiar a agricultura do norte fluminense, mas outras regiões”, relata o pesquisador
Amplo estudo
O resultado desses debates é um estudo feito pelos pesquisadores e técnicos da Embrapa (Embrapa Agrobiologia, Embrapa Solos, Embrapa Agroindústria de Alimentos e Embrapa Soja), Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro (Pesagro-Rio) e Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O levantamento traz informações sobre solo, clima, períodos adequados para a semeadura, dados sobre uso da terra e situação fundiária nas terras agricultáveis da região. Grande parte dos dados obtidos foi reunida neste documento técnico.
Sabe-se, por exemplo, que aproximadamente 40% da área distribui-se entre pequenas e médias propriedades rurais e representam mais de seis mil estabelecimentos considerando toda região norte fluminense. Entretanto, o restante da área, algo em torno de 200 mil hectares, está distribuído em 373 propriedades com média de 510 hectares. “São essas terras, possivelmente antigas fazendas canavieiras, que podem ser exploradas para o plantio de grãos de forma mais extensiva”, complementa a pesquisadora Claudia Jantália.
O município de Campos dos Goytacazes, no norte fluminense, já foi um grande produtor de cana-de-açúcar por pelo menos três séculos. O estudo mostra que existe uma área potencial importante que pode ser explorada recuperando terras que, após o ciclo da cana, viraram capim para alimentação bovina ou foram abandonadas. “São áreas que estão abandonadas ou sendo exploradas pela pecuária extensiva com baixa tecnificação”, informa Zilli. Segundo o pesquisador, o alto grau de degradação dessas terras impõe urgência na busca por alternativas aos produtores.
Em três décadas, a redução da área plantada com cana-de-açúcar no norte fluminense foi superior a 150 mil hectares, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São terras que não voltaram a ser ocupadas por outras lavouras. Trata-se de uma mudança no uso da terra ou mesmo um eventual abandono como áreas improdutivas. Essas áreas, possivelmente, somaram-se aos milhões de hectares de pastagens existentes no estado, e a maior parte com elevado grau de degradação.
De acordo com os pesquisadores, em paralelo ao declínio das áreas de produção de cana observado a partir da década de 1990, a bovinocultura cresceu na região, aumentando o número de cabeças animais em mais de 60% em cerca de 30 anos. Segundo dados da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio de Janeiro (Emater-RJ), a região norte fluminense concentra mais de 30% do efetivo bovino do estado, incluindo gado de corte e leite. Provavelmente, a expansão da pecuária se tornou a opção de renda, ou também a estratégia de menor custo para manter a propriedade da terra.
Fonte: Embrapa