Por Heráclito Noé*
É fato incontestável a importância do Agro Negócio para o nosso país, seja pelo aspecto macro econômico, devido a grande importância do setor para o PIB nacional e a balança comercial externa, seja pela função de garantir o mínimo existencial com produção de alimentos visando saúde e bem-estar de toda sociedade.
Justamente por isso temos uma gama de instrumentos legais que visam fomentar e garantir a continuidade da exploração dessa atividade que apesar de sua importância e pujança tem contra si inúmeras variáveis, como reflexos do comércio exterior, política cambial e problemas climáticos que podem prejudicar em muito as operações.
Dentre esses dispositivos legais destacamos que a Lei 4.829/65 institucionalizou o crédito rural e ao mesmo tempo atribuiu competência ao Conselho Monetário Nacional para disciplinar estas operações.
Até pouco tempo as regras do crédito rural junto as instituições financeiras eram estabelecidas pelo MCR 2.6.9 que dentre outras coisas trouxe de forma explícita o direito ao alongamento dos créditos rurais, afirmando que:
“Independentemente de consulta ao Banco Central do Brasil, é devida a prorrogação da dívida, aos mesmos encargos financeiros antes pactuados no instrumento de crédito, desde que se comprove incapacidade de pagamento do mutuário, em consequência de: (Circ 1.536) a) dificuldade de comercialização dos produtos; (Circ 1.536) b) frustração de safras, por fatores adversos; (Circ 1.536) c) eventuais ocorrências prejudiciais ao desenvolvimento das explorações. (Circ 1.536).”
Dessa forma, temos na legislação federal em vigor um comando de natureza cogente, determinando o direito a prorrogação da dívida originária do crédito rural, quando ocorram as hipóteses acima delineadas, para terem seus débitos repactuados, de forma a adequá-los a sua nova capacidade de adimplemento.
Ocorre que recentemente, precisamente em maio de 2021, houve uma atualização do MCR anterior (2.6.9) para o MCR 2.6.4, modificando o texto até então vigente. Essa modificação, ao menos em parte, poderá acarretar interpretações que levem ao entendimento de que a partir de agora haveria uma maior discricionariedade das instituições financeiras em conceder ou não o alongamento do crédito rural, gerando assim uma maior insegurança jurídica aos produtores e ensejando maiores cuidados dos mesmos na comprovação dos requisitos legais para terem seus pedidos de alongamentos deferidos.
Para melhor ilustrar, destacamos o trecho que gera maior controvérsia:
ANTES:MCR 2.6.9 -Independentemente de consulta ao Banco Central do Brasil, é devida a prorrogação da dívida, aos mesmos encargos financeiros antes pactuados no instrumento de crédito, desde que se comprove incapacidade de pagamento do mutuário, em consequência de: a) dificuldade de comercialização dos produtos; b) frustração de safras, por fatores adversos; c) eventuais ocorrências prejudiciais ao desenvolvimento das explorações.
AGORA:MCR 2.6.4 -Fica a instituição financeira autorizada a prorrogar a dívida, aos mesmos encargos financeiros pactuados no instrumento de crédito, desde que o mutuário comprove a dificuldade temporária para reembolso do crédito em razão de uma ou mais entre as situações abaixo, e que a instituição financeira ateste a necessidade de prorrogação e demonstre a capacidade de pagamento do mutuário: a) dificuldade de comercialização dos produtos; b) frustração de safras, por fatores adversos; c) eventuais ocorrências prejudiciais ao desenvolvimento das explorações.
Ora, a alteração redacional acima exposta, mais precisamente contida na Seção 6, capítulo 2 do item 4 do MCR 2.6.4, poderá acarretar uma possível mudança de postura dos agentes financeiros diante dos pedidos de alongamento do crédito rural.
Apesar de entendermos que a simples mudança redacional e terminológica de alguns termos não retiraria a força cogente da norma em reconhecer o direito a prorrogação desde que comprovadas as situações descritas nas alíneas “a”, “b” e “c” acima destacadas, no início de sua aplicação poderá haver uma postura mais inflexível por parte das instituições financeiras, interpretando que agora haveria um certo grau de discricionariedade na avaliação dos requerimento que lhe forem apresentados a partir de então.
QUAL POSTURA O PRODUTOR DEVE ADOTAR?
Ante a alteração do MCR e das informações acima apresentadas, verificamos que haverá uma necessidade cada vez maior do produtor rural buscar assessoria técnica especializada quando visando maior eficiência na prorrogação de seu crédito rural.
Com o amparo de profissionais qualificados haverá uma análise detalhada do seu fluxo de caixa, capacidade produtiva e de comercialização e a partir disso o produtor poderá comprovar de forma mais robusta e convincente a diminuição da sua capacidade de pagamento, com o enquadramento da sua situação nos moldes da MCR 2.6.4 e Lei 4.829/65, e com isso aumentar de forma considerável as suas chances de ter reconhecido o direito a prorrogação dos seus créditos rurais já na esfera administrativa.
Quanto maior for a produção de provas e a análise técnica e detalhada do seu fluxo de caixa bem como das suas capacidades produtiva e de pagamento maior serão suas chances em obter a prorrogação de suas dívidas.
*Heráclito Higor Bezerra Barros Noé é advogado empresarial – Especialista em Direito Público e Tributário pela UFRN – Associado Amaral & Melo Advogados, Consultor da Agri Company em Crédito Rural e Gestão Patrimonial.