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Nordeste – Cientistas reúnem iniciativas sustentáveis praticadas por agricultores familiares maranhenses

Em uma das regiões com os menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil, famílias agricultoras e extrativistas encontraram meios de se sustentar sem prejudicar o meio ambiente. Uma pesquisa multidisciplinar desenvolvida pela Embrapa observou e registrou essas práticas que deram origem a uma inédita coleção: Mestres do Agroextrativismo no Mearim, disponível gratuitamente na internet.

Com base no conhecimento tradicional, esses produtores da região conhecida como Médio Mearim, no estado do Maranhão, empregam práticas conservacionistas para a recuperação de áreas degradadas e da fertilidade do solo, como a produção diversificada, integração da agricultura com a atividade extrativa e a criação animal, reflorestamento com espécies arbóreas e frutíferas, substituição do uso do fogo na agricultura e sistemas agroflorestais.

A pesquisa teve início em 2017, em parceria com a Associação em Áreas de Assentamento no Estado do Maranhão (Assema). O grupo sistematizou 30 iniciativas exitosas em boas práticas de agricultura, pecuária e extrativismo, incluindo sistemas agroflorestais, reflorestamento, recuperação de áreas degradadas e a integração da criação animal nas áreas cobertas pela palmeira babaçu (Attalea speciosa Mart. ex Spreng).

O projeto busca garantir renda e sustento a centenas de famílias que vivem da terra. As ações estão espalhadas por seis regiões com grande riqueza de biodiversidade mas que possuem baixos Índices de Desenvolvimento Humano no Cerrado, na Caatinga e na Amazônia.

Mais de 130 mil pessoas vivem na área rural do Médio Mearim, sobretudo agricultores familiares, assentados e comunidades quilombolas. O babaçu passou a dominar a paisagem em sucessão, tornando-se a espécie florestal predominante.

Práticas do bem viver

As iniciativas selecionadas envolvem práticas agropecuárias e florestais que aliam os saberes tradicionais das comunidades locais a tecnologias adequadas à realidade do meio rural. O trabalho integrou elementos da metodologia etnográfica, pesquisa quantitativa e mapeamento participativo.

A seleção das iniciativas levou em conta o destaque das famílias na condução de uma ou mais atividades em oito eixos produtivos: (1) reflorestamento, sistemas agroflorestais e cultivos perenes diversificados para restauração de áreas degradadas e conservação da biodiversidade; (2) cultivos anuais intensificados sustentáveis que demandam menos mão de obra ou menos área; (3) cultivos anuais tradicionais com menor impacto ambiental; (4) cultivos comerciais de hortaliças; (5) pecuária em pastagens produtivas integradas em babaçuais; (6) inovações na criação de pequenos animais; (7) processamento de frutas, mandioca ou leite; e (8) processamento do coco babaçu para produção de azeite, carvão, mesocarpo e confecção de artesanato.

Saber tradicional aliado à tecnologia

A publicação destacou a restauração de áreas de preservação permanente, como as margens dos igarapés, com plantio de espécies arbóreas; a restauração produtiva de áreas com sistemas agroflorestais; a produção de mudas florestais – como mogno, aroeira, ipê, jatobá, mutamba, maçaranduba, angico-branco, paricá, angelim; e em particular o uso de espécies leguminosas como o sabiá (Mimosa caesalpiniifolia Benth.) para recuperação da fertilidade do solo.

Com relação à produção agropecuária, além do plantio de culturas alimentares anuais e hortaliças com menor impacto ao meio ambiente, a coleção destacou a diversificação de culturas perenes, com ênfase na produção de espécies frutíferas como banana, cajá, caju, acerola, cupuaçu, açaí e abacaxi, entre outras. O trabalho enfatizou ainda o beneficiamento das frutas, com a produção de polpas, que figura entre as principais oportunidades econômicas para as famílias.

A pesquisa identificou também técnicas de recuperação do solo consagradas pela ciência, como a cobertura do solo com biomassa, que mantém a umidade do solo e aumenta disponibilização de nutrientes aos cultivos; além do uso de biofertilizantes e de defensivos naturais. A intensificação da produção de mandioca, arroz, milho e feijão com menor impacto ambiental, substitui o corte e a queima no preparo das áreas pela cobertura morta, e realiza alternância de áreas com, no mínimo, seis anos de pousio (descanso).

Para a pesquisadora da Embrapa Tatiana Sá, o trabalho mostra os desafios da atividade agroextrativista da região, e as saídas que as famílias encontraram na agricultura familiar, no extrativismo do babaçu e de outras palmeiras. “Se pensarmos em um processo de transição agroecológica, essas experiências nos mostram uma diversidade de atividades que vão para além da agropecuária, vemos uma atividade da sociobiodiversidade de famílias que vivenciam o desafio diário de encarar sua sobrevivência”, analisa.

As vidas do Mearim

Uma das famílias retratadas na coleção é a de Matias Sousa Nascimento, 55 anos, e Isabel Beta de Lima, 56 anos, que residem no município de Poção de Pedras, a 350 quilômetros da capital maranhense. Nascimento conta que foi o “primeiro maranhense de Poção de Pedras a estudar em uma escola rural, em 1983”. Ele foi aluno e depois monitor da primeira Escola Família Agrícola (EFA) do estado do Maranhão.

Em 26,5 hectares, área chamada de sítio Preservida, ele dá uma aula de como produzir alimentos, aproveitar os recursos naturais e ajudar a natureza a se regenerar. “Isso tudo é uma forma de relação com a natureza, de contribuir com o meio ambiente. Você não produz só para você, produz também para os pássaros, para os animais em geral, para o solo, para as plantas”, ensina o agricultor.

A propriedade é dividida em quatro setores: frutas, hortaliças, roça de mandioca e criação de animais. A produção é integrada ao plantio de essências florestais. Ele também mantém uma área de floresta secundária com mais de 30 anos.

Exemplo para fazendeiros vizinhos

É no sítio Preservida que Nascimento e sua família – um dos três filhos trabalha com ele e com a esposa na propriedade – recebem estudantes, agricultores e pesquisadores de diversos estados para conhecer o manejo integrado e os sistemas agroflorestais implantados no local. Mas uma das mais importantes mudanças para o agricultor está bem próxima. “Meu sítio é rodeado de grandes fazendeiros. E hoje eles me procuram para buscar mudas e orientação para plantar em suas áreas. Isso me dá uma satisfação enorme”, conta com empolgação.

Nascimento conseguiu convencer pequenos e grandes agricultores que produzir, recuperar e preservar é um bom negócio. “Eu sinto muita alegria quando recebo as pessoas aqui, mostro esses resultados e vejo a expressão no rosto delas. E quando vejo uma empresa como a Embrapa valorizar esse trabalho, dá mais orgulho ainda”, diz.

Mulheres agroextrativistas

O trabalho feminino, evidenciado pelas mulheres quebradeiras de coco babaçu, é uma característica da região. Dona Lila se destaca pelas ações de reflorestamento com espécies madeireiras e frutíferas.

Dona Lila e o marido, Antônio Alves de Araújo, vivem na comunidade Centro dos Cocos, município de São Luís Gonzaga do Maranhão. As principais atividades econômicas da família, além da produção de mudas para reflorestamento, são a roça de mandioca, a produção e o processamento de frutas para a comercialização das polpas.

Fonte: Embrapa Amazônia Oriental Por Ana Laura Lima

Crédito: Aline Nascimento

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