Quando o consumidor compra frutas, legumes e verduras no supermercado, escolhe os produtos conforme seus critérios e gosto pessoal. Mas, via de regra, ele não sabe que parte dos produtos ofertados obedece a rigorosos controles de segurança alimentar, que incluem não apenas boas práticas agrícolas, mas também sustentabilidade e bem-estar do trabalhador. São os produtos certificados, que precisam passar por auditorias para receber a certificação. No ponto de venda geralmente não há distinção entre o vegetal certificado e o que não tem certificação.
A certificação é tema do podcast Ascenza, disponível na área reservada no site da Ascenza (Link). O bate-papo contou com a engenheira agrônoma, consultora e treinadora registrada Global G.A.P, Camila Schorr Reinert, a engenheira agrônoma e Gerente de marketing e desenvolvimento de mercado da Ascenza Brasil, Patrícia Cesarino, e Sabrina Goveia, responsável por toda comunicação da Ascenza Brasil.
Uma das mais respeitadas certificações é a Global GAP (Good Agricultural Practices em inglês e Boas Práticas de Agricultura em português), sistema internacionalmente reconhecido para a produção agrícola, que tem como objetivo garantir segurança dos alimentos, respeito ao meio ambiente e cuidados com os trabalhadores. É um padrão voluntário, desenvolvido em colaboração com diversos setores da indústria, incluindo produtores, varejistas e órgãos certificadores.
Camila Schorr Reinert, que há 12 anos trabalha como auditora, consultora e treinadora no setor de certificação, comenta que 23% da produção de abacate no Brasil é certificada pela Global GAP. Mas, no ponto de venda, esse produto certificado pode acabar sendo misturado com outros abacates que não são necessariamente produzidos com rigorosos controles de qualidade.
“Uma pesquisa recente apontou que 55% dos consumidores pagariam mais por produtos seguros, mais sustentáveis, com mais respeito ao meio ambiente, ao social e a todo o processo de produção. Mas hoje o Brasil ainda não tem na embalagem informações de produção certificada. Hoje a certificação fica restrita à nota fiscal. Essa informação precisa chegar ao consumidor”, afirma Camila.
Camila lembra que, no caso de exportações, as certificações valorizam e precificam os produtos. “O objetivo é que no futuro as certificações representem dinheiro no bolso do agricultor também no Brasil. Algumas empresas já pagam preços diferenciados no mercado interno por produtos certificados. É a tendência, uma vez que a certificação tem custo para ser implementada”, comenta.
Segundo a engenheira agrônoma e gerente de marketing e desenvolvimento de mercado da Ascenza Brasil, Patrícia Cesarino, a certificação muda a cultura do produtor porque impacta nas mais diferentes formas de gestão da propriedade, do cuidado com o cultivo, respeito ao ambiente, sustentabilidade até a valorização do trabalhador. “Todos ganham”, garante
Camila cita um caso de certificação em que os auditores conseguiram matricular o filho de um funcionário da fazenda na escola. A criança estava fora da escola porque não havia vaga na rede pública, mas os auditores intervieram e fizeram com que a lei fosse cumprida e a propriedade ficasse em dia com as questões sociais da certificação.
Segmentos
Camila atua com o Global GAP há dez anos e explica que a certificação pode ser adotada no mundo todo por diferentes segmentos do setor agropecuário, carnes, aves, apicultura, grãos, frutas, legumes e vegetais. Ela comenta que, no Brasil, o sistema de certificação é mais utilizado por produtores do setor de hortifrúti.
Mesmo que ainda não esteja no preço final do produto, a certificação é vantajosa para o produtor porque abre portas no mercado. “No mercado externo a certificação Global GAP é uma exigência básica. No mercado interno também tem aumentado a demanda por produção certificada, Neste momento, as produções certificadas podem não ganhar em preço no mercado interno, mas ganham referência em mercado por se tratar de um produto seguro”, afirma Camila.
Organização
Segundo Camila, da porteira para dentro, a certificação representa organização, proteção, cuidado com o registro do que está sendo feito na propriedade, com a adoção de medidas corretas em todos os aspectos.
Para obter a certificação a propriedade passa por avaliação de risco, definição dos procedimentos e registro de todos os processos. “Mais de 60% do Global GAP é legislação. O sistema faz com que o produtor registre tudo o que é feito na fazenda, garantindo a gestão documental, o que não é comum hoje”, diz Camila.
De acordo com Camila, o produtor rural é carente de informações sobre boas práticas e manejo integrado. Ela lembra que até questões de solo, como erosão, são contempladas nas certificações. “Os registros começam na origem da semente, das mudas, até a comercialização do produto, a higiene do caminhão que leva a produção até o consumidor”, diz.
A Global GAP não tem limite para tamanho de propriedade. Segundo Camila, mais de 80% das certificações do sistema são produções de até três hectares de área, inclusive de agricultura familiar. Exceto cultivos para fins medicinais ou extrativismo, qualquer cultura pode obter o Global GAP.
Alface certificado
No Nordeste brasileiro, comenta Camila, há fazendas certificadas há mais de 15 anos. O primeiro alface certificado no Brasil foi em 2018. Hoje a certificação é usada na produção de outras folhosas, folhas babies, tomate, abacate, uva, manga, entre outros.
Os produtores são treinados para iniciar o trabalho de adequação da produção certificada, com registros e comprovantes de procedimentos. Depois que a propriedade recebe o certificado, ela passa por uma avaliação anual de manutenção das certificações. Todos os anos os requisitos são revisados.
Camila esclarece que o Global GAP é uma norma de certificação para produção de alimento seguro focada em boas práticas agrícolas, independentemente se os insumos são químicos ou biológicos. “A certificação orgânica do Brasil não é tão precisa e rigorosa no que se refere a segurança como o Global GAP. O uso de defensivos, por exemplo, obedece a um nível de controle que fica abaixo do nível de dano, garantindo segurança ao consumidor”, alega.
Minor Crops
No caso das minor crops, culturas com suporte fitossanitário insuficiente, para as quais há pouca ou nenhuma opção de defensivos registrados para controle de pragas e doenças, os produtores contam com o apoio de um comitê que define os ativos que podem ser utilizados para aquele produto por extrapolação, a partir de uma cultura de referência.
No caso do abacate, diz Camila, dos 48 ingredientes ativos com produtos formulados registrados, 41 têm ingredientes ativos de registro por extrapolação, por cultura de referência. No caso do pimentão, dos 80 ingredientes ativos, 58 vieram por extrapolação. Ela explica que o Global GAP avalia uma ampla gama de princípios ativos.
“Pesquisa da Anvisa mostra o quanto o Brasil avançou na contaminação. Entre 2013 e 2015, os produtos avaliados apresentaram mais de 10% de contaminação. Hoje esse índice está em menos de 1%. Na cesta de frutas, legumes e vegetais, 30% dos produtos tem 0,6% de contaminação”, diz.
Fonte: Silvana Guaiume