Produtores rurais e empresas do agro que vendem mercadorias para fora do estado de São Paulo precisam lidar com um cenário complexo de alíquotas diferenciadas de ICMS, regras específicas de cada unidade federativa e exigências formais que, se descumpridas, podem inviabilizar a recuperação do imposto ou resultar em pagamentos indevidos.
“O que mais vemos no dia a dia são produtores que presumem que a operação com outro estado funciona da mesma forma que em SP. Mas basta um código errado ou um credenciamento ausente para o crédito ser negado. Um crédito mal lançado ou uma operação sem documentação adequada em uma venda para fora de SP pode anular completamente a recuperação do ICMS. Esse tipo de prejuízo é invisível, mas recorrente”, afirma Altair Heitor, CFO da consultoria tributária Palin & Martins.
Regras que variam de estado para estado
Diferentemente do que muitos empresários acreditam, o ICMS não possui uma padronização nacional plena. Apesar de existir um convênio entre estados no âmbito do Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária), cada unidade da federação possui autonomia para definir regimes especiais, obrigações acessórias e exigências complementares, como:
- Credenciamento prévio para apropriação de créditos;
- Alíquotas específicas por produto ou operação;
- Tratamento diferenciado para substituição tributária;
- Variações na forma de cálculo do diferencial de alíquota (DIFAL).
“É muito comum o produtor acreditar que, por estar emitindo uma nota fiscal com os mesmos dados que usa dentro do estado, o crédito será aceito normalmente fora. Mas o Fisco do outro estado pode não reconhecer a operação como válida para crédito, ou aplicar uma alíquota maior e exigir complementação via GNRE. Isso derruba o caixa da empresa”, explica Altair.
Prejuízo invisível, mas recorrente
Levantamento feito pela própria Palin & Martins com base em auditorias fiscais realizadas entre 2021 e 2024 mostra que em 44% das operações interestaduais analisadas havia erros que inviabilizavam a recuperação total do ICMS. A maior parte dessas falhas estava relacionada à:
- Classificação incorreta de CFOP (Código Fiscal de Operações);
- Uso de NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul) divergente da operação real;
- Ausência de documentação complementar exigida no estado de destino;
- Falta de credenciamento ativo para venda interestadual.
“O grande problema é que esse tipo de erro não aparece no DRE da empresa como uma despesa. Ele simplesmente reduz o valor que poderia ser recuperado ou aumenta o imposto devido, corroendo a margem sem alarde”, explica o especialista.
Diferença nas alíquotas afeta o resultado
As alíquotas interestaduais do ICMS variam conforme o destino da mercadoria. Em geral, aplicam-se 12% ou 7%, dependendo da região do país, mas estados como Bahia, Ceará e Pará já anunciaram mudanças em seus regimes internos, ampliando o controle sobre os créditos recebidos.
Além disso, a obrigatoriedade do DIFAL (Diferencial de Alíquota) nas vendas para consumidores finais não contribuintes, estabelecida pela Emenda Constitucional 87/2015 e regulamentada por diversos estados, adiciona outra camada de complexidade para operações B2C interestaduais. A depender da origem e destino da mercadoria, a empresa vendedora pode ter que recolher um complemento da alíquota estadual interna.
“O ICMS foi desenhado para ser não cumulativo, mas, na prática, erros operacionais e desconhecimento da legislação local fazem com que ele se torne cumulativo na ponta. E isso é especialmente grave no agro, onde as margens já são pressionadas”, reforça Altair.
Como evitar o prejuízo
A recomendação de Altair para empresas do agro que operam fora de SP é clara: investir em planejamento fiscal interestadual antes de emitir a nota. Isso inclui:
- Mapeamento detalhado da legislação dos estados de destino;
- Consulta prévia à classificação fiscal da mercadoria;
- Verificação de obrigações acessórias e credenciamentos específicos;
- Adoção de sistemas que integrem emissão fiscal e compliance.
- “É preciso encarar cada operação interestadual como um projeto técnico. A nota fiscal é o coração do processo, e qualquer erro ali compromete todo o resultado. Hoje, a fiscalização está automatizada, e os sistemas da Sefaz cruzam dados em tempo real. Não tem espaço para amadorismo”, conclui Altair.
Fonte: Carolina Lara



