Testes realizados na Embrapa Agroindústria Tropical (CE) e Embrapa Recursos Genéticos (DF) revelaram ser possível preservar o patrimônio genético do cajueiro, a longo prazo, por meio de sementes. Pelas características da planta, acreditava-se que as sementes do cajueiro não se mantivessem viáveis por longos períodos. Contrariando essa ideia, sementes guardadas há 20 anos foram testadas com índice de germinação de 90%. Esse resultado é um alento para a ciência, que está preocupada com o declínio crescente de populações de cajueiro, em decorrência do desmatamento, agricultura extensiva e da intensa ocupação da terra nas áreas de ocorrência natural da planta.
O resultado do teste animou os pesquisadores porque a manutenção de sementes em câmara fria ampliará os esforços de conservação da diversidade. Até agora, o padrão estabelecido é a utilização de plantas em campo e telado, uma estratégia que exige grande investimentos em área agrícola, insumos e serviços.
Para os pesquisadores, a viabilidade de uma segunda via de conservação representa uma esperança para o futuro. “O cajueiro é uma importante planta nativa, os velhos cajueiros gigantes, mesmo improdutivos, guardam um rico patrimônio genético”, diz a pesquisadora Ana Cecília Ribeiro de Castro, coordenadora do Banco de Germoplasma de Cajueiro, o BAG Caju – o maior e mais antigo banco dedicado à conservação da variabilidade genética do cajueiro do mundo. A cientista salienta que essa variabilidade é muito valiosa e guarda riquezas como resistência a doenças e pragas que poderão surgir no futuro.
Do gelo para a mesa: sementes conservadas há mais de 20 anos germinam como novas
Ana Cecília Ribeiro de Castro (foto à direita) explica que até o momento não havia dados de pesquisa que atestassem a viabilidade da manutenção de sementes de cajueiro a longo prazo. Uma remessa de sementes guardadas há 20 anos a – 20°C na Coleção de Base de Sementes (Colbase) – mantida na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, revelou que essa é uma estratégia factível. “Solicitamos o material ao pesquisador Juliano Pádua, responsável pela Colbase. A germinação foi praticamente a de uma semente recém-colhida. Excelente”, comemora.
Segundo a pesquisadora, o material foi solicitado após a realização de testes de germinação favoráveis, com sementes de safras passadas, guardadas por até 10 anos em câmara refrigerada (18°C). “O BAG Caju não faz conservação de semente, a prioridade é a planta clonada no campo”, diz. Entretanto, com a estruturação de um programa de qualidade nas atividades do banco, percebeu-se que havia poucos dados a respeito da viabilidade das sementes de uso geral guardadas, o que levou a pesquisadora a realizar os testes.
Ela explica que uma semente de cajueiro guardada em temperatura ambiente começa a perder o poder de germinação a partir de seis meses. Existe também uma diferença genética. Há sementes com alto índice de germinação e outras que germinam pouco. “Uma semente que geneticamente germina pouco, não vai melhorar o índice de germinação depois de guardada, mas uma semente de alto índice de germinação, guardada de qualquer forma, aos poucos vai perdendo o poder de germinação”, diz.
A cientista pondera ainda que embora represente uma boa alternativa, esse avanço não substitui a necessidade de manter as plantas clonadas no campo, porque o cajueiro é uma espécie alógama. Isso significa que sua fertilização é cruzada. Ou seja, uma semente apenas não carrega todas as características expressas na planta que a gerou. “Se pego sementes no campo aleatoriamente, vou ter árvores diferentes, em termos de fenótipo. Para representar uma planta no BAG serão necessárias muitas sementes, ou simplesmente obtê-la por clonagem”, explica.
Para ela, a maior importância do trabalho é a possibilidade de ampliar os esforços de conservação da biodiversidade do cajueiro, mesmo que não tenha como analisar agora. “Eu posso coletar a biodiversidade agora para, em uma segunda etapa, com ferramentas analíticas mais robustas, daqui a 20 anos, quem estiver no meu lugar tenha o recurso genético guardado”, revela.
Cajueirinho botador
Foi do material colecionado no BAG Caju que o melhorista Levi de Moura Barros selecionou e desenvolveu os primeiros clones de cajueiro anão-precoce – plantas que hoje garantem uma cajucultura mais produtiva e viável como agronegócio.
Os dois primeiros clones foram lançados em 1983. Mas o sucesso veio um ano depois, quando o jornalista Ivaci Mathias, na época repórter do programa Globo Rural, visitou a estação experimental de Pacajus para responder a uma carta de uma telespectadora sobre uma doença de cajueiro. “Eu estava na estação e aproveitei para mostrar algo mais interessante a ele”, lembra Barros.
Quando o repórter se deparou com uma plantinha de seis meses, com menos de 1 metro de altura, frutificando um caju amarelo, bem maduro, ficou impressionado. “Quando a matéria saiu, a repercussão foi tão grande que não tínhamos dinheiro para pagar os selos e responder às cartas que chegaram”, lembra o pesquisador. No primeiro mês foram mais de 10 mil cartas que eram transportadas dentro da estação experimental em um carrinho de mão.
Atualmente, no estado do Ceará, o cajueiro-anão responde por 56% da produção de castanha, ocupando cerca de 34% da área dedicada à cultura do caju, conforme o IBGE. A produtividade média do cajueiro-anão, em 2019, também no Ceará, foi de 528 kg por hectare/ano. E a do cajueiro comum, de 222 kg por hectare/ano (IBGE, 2020). Embora produzindo mais do que o dobro, a produtividade do cajueiro-anão é considerada baixa para o potencial da cultura.
Credito: Luiz Augusto Lopes Serrano
Fonte: Embrapa Agroindústria Tropical por Verônica Freire