Diante da crescente preocupação com as mudanças climáticas, um novo estudo da Universidade Federal de Lavras (UFLA) revela uma abordagem inovadora para transformar resíduos agroindustriais da Amazônia em carvão vegetal, fonte de energia renovável. A pesquisa foca na casca da castanha-do-pará e nos restos do açaí, ambos amplamente descartados, mas que têm um alto potencial energético.
O Brasil é o maior produtor de açaí do mundo, gerando aproximadamente 1,7 milhão de toneladas, e a produção de castanha-do-pará alcança 38 mil toneladas. A pesquisa aponta, portanto, para uma solução que pode não apenas reduzir desperdícios, mas também contribuir para uma bioeconomia mais sustentável na região.
Por meio de um processo chamado pirólise (aquecimento controlado, realizado sem oxigênio, que resulta em um produto com propriedades energéticas otimizadas), esses resíduos são convertidos em biochar, um biocombustível sólido que promete melhorar a eficiência energética e minimizar os impactos ambientais. A doutoranda Ianca Oliveira Borges, responsável pela pesquisa, sob a orientação do professor do Departamento de Ciências Florestais (DCF) Gustavo Henrique Denzin Tonoli, explica que os biocombustíveis sólidos são combustíveis de origem vegetal que se encontram em estado sólido à temperatura e pressão ambiente. “São uma forma de aproveitar a biomassa e, em geral, são mais sustentáveis do que os combustíveis fósseis, pois são renováveis e emitem menos gases poluentes”.
Os resultados mostraram que o resíduo de açaí possui um poder calorífico superior (PCS) a 19,77 MJ/kg, ao passo que a casca de castanha alcança 21,07 MJ/kg. Isso significa que esses materiais têm um alto potencial energético para ser explorado, superando o poder energético de muitos biomateriais convencionais. Além disso, o biochar apresenta maior estabilidade térmica e menor teor de voláteis, o que pode torná-lo uma opção viável e eficiente para substituir combustíveis fósseis, como petróleo, carvão e óleo diesel.
Futuro Sustentável
O impacto dessa pesquisa vai além da produção de energia. Ela oferece uma oportunidade para transformar resíduos que hoje são descartados em fontes renováveis, beneficiando diretamente as comunidades locais. Isso não apenas ajuda a reduzir os custos com energia, mas também traz vantagens socioeconômicas, especialmente em regiões mais vulneráveis.
O biochar, além de ser uma alternativa energética, atua como um “fixador de carbono”, contribuindo para a melhoria da qualidade do solo e para a sustentabilidade ambiental. Com isso, essa abordagem inovadora pode ajudar a enfrentar os desafios das mudanças climáticas. “Uma das principais vantagens do biochar é a sua produção a partir de materiais orgânicos de fontes renováveis, reduzindo a dependência de combustíveis fósseis e contribuindo para um modelo de economia circular. Além disso, sua combustão gera menos emissões de dióxido de carbono comparado aos combustíveis fósseis convencionais, pois parte do carbono contido no biochar permanece fixado no material, evitando sua liberação para a atmosfera. Outra característica relevante é seu alto poder calorífico, tornando-o uma alternativa eficiente para sistemas de aquecimento e geração de energia, sem a necessidade de grandes ajustes tecnológicos”, complementa a pesquisadora.
Além dos benefícios energéticos, o biochar pode ser incorporado ao solo para melhorar sua fertilidade e capacidade de retenção de água, funcionando como um sumidouro de carbono e contribuindo para a mitigação das mudanças climáticas. “Esse uso adicional amplia sua sustentabilidade, tornando-o uma alternativa viável para diversas aplicações ambientais e energéticas. Dessa forma, o biochar não apenas substitui combustíveis fósseis em certas funções, mas também oferece vantagens ecológicas significativas, promovendo um uso mais eficiente dos recursos e reduzindo impactos ambientais negativos”, destaca Ianca.
Essa pesquisa está alinhada com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU), que buscam garantir acesso à energia limpa e acessível, promover o consumo responsável e combater as mudanças climáticas. “A valorização da biomassa amazônica, por meio da produção de biochar, aponta para um caminho promissor na luta contra as mudanças climáticas. Ao transformar resíduos em recursos, a ciência está ajudando a construir um futuro mais sustentável para a Amazônia e para o mundo”, comenta a pesquisadora.
Fonte: UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS