Os desafios para a manutenção da sociobiodiversidade diante de um cenário de crise climática e alimentar foram tema de evento no sábado (15), na AgriZone, em Belém. Mediado pela pesquisadora Dalva Mota, da Embrapa Amazônia Oriental, o painel apresentou quatro experiências de resistência entre agricultores e comunidades tradicionais.
Primeira painelista, a articuladora da Rede Bragantina de Economia Solidária Artes & Sabores, Nazaré Reis, expôs a resistência de comunidades tradicionais, como quilombolas, que se alimentam de riquezas locais (manga, jaca, castanha etc.) e buscam preservar e mostrar aos mais jovens seus costumes. Esse modo de vida, no entanto, é ameaçado por outras formas de uso da terra. E a estratégia de superação dos desafios envolve a busca pela organização social e econômica, a diversidade e a aproximação com o conhecimento científico.
Nesse ponto, a painelista lembrou do êxito do projeto de inovação social da parceria da Rede Bragantina com a Embrapa, que tem transformado farinhas artesanais da Amazônia em produto de mercado. “Temos de buscar uma ciência que coloque a natureza no centro; e não o homem”, concluiu.
Representando a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), a painelista Glória Araújo abordou as estratégias de acesso à água e conservação da biodiversidade nessa região do país. A ASA é uma rede formada por mais de 3 mil organizações da sociedade civil de distintas naturezas. Segundo Glória, a história do Semiárido é marcada pela concentração de terras e políticas públicas voltadas para beneficiar grandes propriedades.
Nas últimas décadas, no entanto, a estratégia proposta para a região não é mais o combate à seca, mas o convívio. “Defendemos o Semiárido como um lugar bom para se viver, onde mulheres e homens são capazes de criar suas próprias soluções”, afirmou.
As estratégias de convívio nesse ambiente, de acordo com a painelista, passam pelo armazenamento de água para o consumo e produção de comida para a segurança alimentar. Essa produção é orientada pela agroecologia, com o uso tanto de sementes nativas quanto de animais adaptadas às condições do Semiárido, fazendo dos agricultores familiares os guardiães da biodiversidade. “A convivência é o nosso jeito de mudar o mundo; e esse jeito é agroecológico”, finalizou.
Já a pesquisadora venezuelana Ana Felicien apresentou suas investigações acerca das práticas alimentares em duas comunidades quilombolas, no Pará e na Venezuela. Ela avaliou que os sistemas produtivos marcados por commodities, como a soja e o petróleo, influenciam negativamente o consumo tradicional.
Apesar da alta diversidade dos alimentos cultivados nos quintais e roças dessas comunidades, a análise das listas de compras revelou uma forte tendência ao consumo de ultraprocessados e industrializados. Ela observou que a alimentação é um ato político e interdisciplinar, ligado à produção e à cozinha. “Na disputa pelo prato, as mulheres têm um papel importante”, concluiu.
O encerramento das exposições coube à antropóloga francesa Pascale de Robert. Ela abordou a diversidade alimentar brasileira, a qual vai muito além do arroz, feijão e carne, englobando a vasta culinária invisível, que inclui os pratos diários e, notadamente, a culinária indígena, pouco valorizada ou turística.
Na região Norte, a palestrante destacou a ascensão de alimentos como o açaí e o tacacá, que alcançaram reconhecimento nacional. Contudo, uma diversidade de outros alimentos consumidos em territórios indígenas são desconhecidos mesmo nas regiões vizinhas. De acordo com a pesquisadora, apesar das crises, essa diversidade agrícola não diminuiu, sendo um ato de resistência e nutrição. Ela considera que a revalorização das sementes, trocadas entre comunidades, e o uso de plantas da floresta demonstram um movimento de retorno aos saberes ancestrais, os quais podem oferecer soluções para o futuro em contraste com os impactos da monocultura.
Fonte: Assessoria de Comunicação – Embrapa



