*Por Ana Maria Mello
É do conhecimento de todos que os trabalhadores rurais possuem seus direitos assegurados assim como os trabalhadores urbanos, senão ainda mais zelados e protegidos, tendo em vista que o campo é o local onde ainda há alta irregularidade trabalhista, inclusive com incidência de trabalho escravo.
O agronegócio é um dos setores em que há uma preocupação justificada no que tange o assunto, onde se busca prevenir os riscos inerentes à atividade rural, sendo indispensável uma gestão interna e conhecimento sobre o tema.
As condições de trabalho dos empregados rurais devem ser adequadas e saudáveis para proporcionar um ambiente de trabalho produtivo e agradável na propriedade rural.
Não existe dúvidas de que um ambiente de trabalho agradável é a premissa para maior satisfação dos empregados e maior produtividade na cadeia produtiva.
Pesquisas sobre o assunto demonstram resultados expressivos, os quais metade dos entrevistados já trocaram de emprego em razão de um ambiente de trabalho estressante e inapropriado.
O ambiente de trabalho que atende às necessidades humanas, dignidade e qualidade de vida dos trabalhadores pode motivar as pessoas a dar o seu melhor na atividade e a não ter vontade de sair do emprego.
Além disso, garantindo um espaço de trabalho apropriado o produtor rural estará evitando prejuízos futuros e zelando pela reputação de seu negócio, pois terá funcionários motivados para exercer suas funções com excelência.
O trabalhador rural, em especial, está diariamente exposto a alguns riscos iminentes a profissão, como por exemplo a função dos aplicadores de veneno, como comumente conhecidos, que estão expostos a agentes químicos que podem causar riscos à saúde por intoxicação em razão do contato com defensivos agrícolas.
Defensivos agrícolas, também chamados de agrotóxicos, são utilizados na agricultura e na pecuária em grande quantidade e em vários setores, como para tratamento de grãos, controle de pragas, tratamento de animais e madeira.
Não se pode negar que a aplicação de defensivos agrícolas faz parte da cadeia produtiva do agronegócio, sendo indispensável para a atividade fim, e, não havendo outro meio que o substitua, o produtor rural tem responsabilidade sobre seus empregados responsáveis pela aplicação.
Desta maneira, por se tratar de uma realidade presente em inúmeras propriedades rurais e que há grande exposição do trabalhador ao agente químico, é preciso ter cuidado quanto ao ambiente insalubre dentro da propriedade.
O ambiente de trabalho insalubre garante ao empregado rural o direito ao recebimento mensal do adicional de insalubridade como uma compensação pelo risco que sofre ao desempenhar a função insalubre.
Afinal, o que é o adicional de insalubridade?
O adicional de insalubridade é um salário condição, que se caracteriza quando o trabalhador rural é exposto a determinados agentes físicos, químicos ou biológicos durante a sua jornada de trabalho, tais como: ruídos, calor, frio, poeira, defensivos e agrotóxicos.
Esse salário condição equivale a um percentual que varia entre 10%, 20% ou 40%, sobre o salário base do trabalhador e irá depender de dois fatores importantes: tempo de exposição e a intensidade de contato do empregado com o ambiente ou agente insalubre durante as atividades diárias.
Nesse sentido, vale observar que não são todos os empregados que fazem direito ao recebimento do adicional, então, é importante que o produtor rural saiba quais empregados fazem jus ao direito para que aconteça o pagamento.
Como saber se o trabalhador rural está exposto a um ambiente insalubre?
A identificação será realizada mediante perícia técnica, na qual o perito avalia o ambiente de trabalho da propriedade rural e determina se o trabalhador possui ou não o direito ao pagamento do adicional.
É na perícia que o perito irá verificar se há agentes insalubres e se também há medidas de prevenção e/ou equipamento de proteção individual capazes de amenizar a insalubridade no ambiente.
O perito também observará se o produtor rural possui documentação que atesta sobre a existência de um ambiente de trabalho saudável e adequado, como Laudo Técnico das Condições Ambientais do Trabalho – LTCAT e Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional – PSMSO.
Portanto, se na perícia o perito verificar que possuem agentes insalubres, como por exemplo os defensivos agrícolas, mas que todos os trabalhadores que tem contato com esses defensivos utilizam luvas, máscaras, botas e outros equipamentos essenciais de proteção, pode ele concluir que o ambiente não seja insalubre e não gere direito do trabalhador ao pagamento do adicional de insalubridade.
Para auxiliar o produtor rural nessa questão, é importante o assessoramento na obtenção dos Equipamentos Individuais necessários, que deverão respeitar o que determina a Norma Regulamentadora nº6 da Portaria nº3.214 do Ministério do Trabalho e Emprego.
É comum o empregador rural realizar o pagamento de adicional no grau máximo para todos os funcionários na intenção de se esquivar de problemas futuros, o que não é o ideal, pois estaria onerando o seu capital de forma equivocada em algo incerto, e estaria em desconformidade com a legislação, o que é inviável em todos os aspectos.
Destacamos, portanto, que não é recomendado que seja feito o pagamento para todos os trabalhadores rurais, mas tão somente àqueles que realmente estão expostos à condição especial de insalubridade.
Por isso é tão importante a gestão interna do negócio, para proteger a saúde e dignidade do trabalhador rural que é a mão de obra do negócio e para adequar o ambiente de trabalho ao que define a legislação.
Insalubridade x periculosidade?
Observamos que o ambiente insalubre não é o único a gerar condição ao pagamento de um adicional ao salário do empregado rural, cabendo destacar as condições especiais previstas na legislação para o pagamento do adicional de periculosidade.
Enquanto o adicional de insalubridade busca indenizar o trabalhador exposto à ambiente insalubridade, o adicional de periculosidade busca indenizar aquele trabalhador rural exposto a ambiente periculoso, ou seja, perigoso.
A primeira grande diferença é quanto ao percentual do pagamento, pois no caso da periculosidade a lei determina o percentual fixo de 30% do salário base, sem variação.
E a segunda diferença é que para o ambiente periculoso a legislação determina que são as atividades que abordam explosivos, inflamáveis, energia elétrica, motocicleta e a exposição a roubo ou violência física (atividades de segurança).
Apesar da lei fazer tal determinação, existem casos em que há necessidade de realização de perícia para constatar a intensidade e o tempo de contato com o agente periculoso, como no caso da energia elétrica, pois se faz necessário a medição da potência dessa energia.
Se for o caso de um contato de baixa potência, o trabalhador não terá direito ao pagamento do adicional de periculosidade, tendo em vista que não estará exposto ao perigo, via de regra.
Outro exemplo que acontece dia-a-dia em propriedades rurais é o trabalhador exposto a atividade de abastecimento do maquinário, que possui contato direto com a bomba de abastecimento.
Por isso, lembramos sobre a importância de que haja documentação adequada do ambiente de trabalho, para evitar eventuais demandas trabalhistas, ou até mesmo, demandas administrativas do Ministério do Trabalho, como autuações e multas.
Então o trabalhador tem direito de receber os dois adicionais?
Não! O trabalhador não pode receber de forma acumulada os valores dos adicionais.
O produtor rural, por meio de gestão interna, analisará a condição de cada funcionário exposto ao ambiente insalubre e periculoso e verificará qual dos adicionais será mais benéfico ao trabalhador.
A partir da perícia que o produtor rural saberá a intensidade da exposição e tempo de contato do trabalhador com o agente insalubre, para posteriormente conseguir verificar qual dos adicionais é mais benéfico e deve ser pago.
A título de exemplo trazemos a figura do Sr. João Silva, trabalhador rural da fazenda do Sr. Dário Rocha, empregado responsável pelo abastecimento do maquinário e também veneneiro, mas que recebe somente o adicional de periculosidade porque na perícia realizada na fazenda há constatação e especificação de que a função do Sr. João Silva é insalubre e periculosa, mas a insalubridade é em grau mínimo (10%) enquanto a periculosidade é contatada no percentual fixo, isto é,a periculosidade é mais benéfica ao trabalhador, pois o percentual é de 30%.
Com todas as observações, será que só com a documentação acerca da saúde e ambiente de trabalho o negócio do produtor rural estará protegido?
Apesar de ser de extrema importância o produtor rural ter toda a documentação e manutenção do ambiente de trabalho saudável e adequado, não existe uma regra que anule qualquer tipo de risco ao negócio.
Mais significativo ainda é que o produtor rural tenha consciência da importância de gestão interna para evitar riscos e eventuais prejuízos e,consequentemente, permitir a melhora da atividade dentro do ramo de especialidade.
Por fim, destaca-se a relevância e interesse em buscar uma assessoria jurídica especializada, especialmente na área trabalhista, que saberá sanar eventuais dúvidas e necessidades do produtor rural dentro de sua particularidade, agindo em conformidade com a legislação e deixando o produtor rural focado na sua atividade-fim, na sua produção no agronegócio e despreocupado de possíveis demandas judiciais.
*Ana Maria Mello, advogada, sócia do AeM Advogados, especialista em Direito do Trabalho.