A água é necessária para fornecer energia e a energia é necessária para tratar a água. A inter-relação entre esses elementos é uma das principais áreas de interesse global e as melhorias de eficiência impactam diretamente a capacidade de manutenção do outro. Então, o que é mais importante, água ou eficiência energética?
Se trata de uma pergunta retórica que não requer hierarquias para ser respondida. Tanto a energia quanto a água são essenciais tanto para a vida quanto para as condições que a tornam habitável. Um mundo de mais de 8 bilhões de habitantes não é capaz de fornecer água potável sem grandes quantidades de energia empregada em seu tratamento. Por outro lado, cada quilowatt-hora consumido na transformação de matérias-primas, alimentação, transporte e outros aspectos da vida cotidiana moderna, tem um componente hídrico incontornável para sua geração, seja ela proveniente de usinas termelétricas, hidrelétricas ou nucleares.
No Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas (ONU – DAES), estão preocupados com as demandas atuais e futuras de água e energia. De acordo com um de seus últimos relatórios, existem 1.300 milhões de pessoas no mundo que não têm acesso à eletricidade ou não dispõem de um acesso confiável e se espera que o consumo aumente em mais de 35% até 2035, o que levará a um aumento de gasto de água de 85% no setor.
Embora um dos temas mais discutidos hoje seja a transição para as energias renováveis, segundo os documentos do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável número 7 da ONU, Energia Acessível e Não Poluente, estas representam apenas 17,5% do consumo final. Enquanto, o mais amplamente usados ainda são de origem fóssil, emitindo 60% de todas as emissões de gases de efeito estufa no mundo.
Então, a eficiência energética torna-se um fator de sobrevivência para a espécie humana. E é nesse setor fundamental que o setor hídrico, especialmente a dessalinização, tem apresentado um dos maiores avanços dos últimos 20 anos.
A Associação Espanhola de Dessalinização e Reúso de Água, AEDyR, destacam que as primeiras plantas de dessalinização que utilizavam energia térmica para evaporar a água do mar e condensar a água doce, tinham um custo médio de energia de 50 kWh por metro cúbico e que com a chegada da osmose inversa passou a 3 kWh/ m3.
As tecnologias de membranas, acompanhadas pela evolução dos materiais e dos sistemas de recuperação de energia, permitiram que o consumo de eletricidade da geração de água doce a partir de água salgada atingisse limites quase termodinâmicos. Assim, o consumo diário de energia necessário para abastecer uma família de quatro pessoas com essa fonte, equivale a manter um ar-condicionado ligado por uma ou duas horas, ou seja, 2,12 kWh por dia.
Para Juan de Beristain, da Fedco, a tarefa pendente é otimizar a eficiência hidráulica, já que atualmente é perfeitamente viável aumentar a recuperação de água nas plantas de dessalinização e levá-las de 45% para pelo menos 55-60% como primeiro objetivo. Ele defende que a nova geração de sistemas de dessalinização de água do mar deve ser focada em aumentar esse valor. Em resumo, produzir mais água dessalinizada a partir da mesma quantidade de água do mar, com um consumo de energia semelhante.
“O projeto hidráulico dessas plantas de dessalinização não evoluiu muito nas últimas décadas. Na busca pela otimização energética, a eficiência hidráulica foi sacrificada no processo. É por isso que a importância da eficiência hidráulica deve ser reconhecida. Ambas as eficiências devem ser otimizadas ao mesmo tempo para alcançar a máxima sustentabilidade nesses sistemas”, completou.
Mas não só a dessalinização tem mostrado avanços significativos na eficiência energética, como também no tratamento e reúso da água. A América Latina conta com um dos exemplos mais importantes do mundo nesse sentido, com o conceito das biofábricas de Águas Andinas em Santiago do Chile, que se aproximam da autossuficiência energética a partir de processos como a biodigestão de resíduos orgânicos, com os quais se abastece a planta de tratamento quase na sua totalidade e com o que se espera transferir energia para a cidade na forma elétrica ou combustível.
Além de sua otimização constante, o setor hídrico também evoluiu para se adaptar às fontes de energia renováveis e sua compatibilidade já foi demonstrada em histórias de sucesso que se estendem por todo o mundo e incluem a América Latina e que terá um de seus maiores expoentes da planta de dessalinização da ENAPAC – Energias e Águas do Pacífico, da Trends Industrial Company – que ficará localizada em Atacama, Chile, e terá uma capacidade máxima de 2.600 l/s. Será a primeira planta multicliente do país, a única de grande escala com energia solar (100 MW) e um dos projetos mais avançados do mundo com uma combinação de dessalinização por osmose inversa e energia fotovoltaica.
As crises hídricas também são energéticas
A disponibilidade de água é fundamental para a geração de energia. É utilizado para o desenvolvimento de infraestruturas, extração e processamento de recursos combustíveis, como refrigeração em centrais nucleares e como irrigação para a produção de biocombustíveis, entre outras aplicações.
A avalanche de desafios que se intensificam com as mudanças climáticas e sua ameaça de redução da disponibilidade de água faz com que os especialistas fiquem mais atentos à quantidade de água utilizada e contaminada para a geração de cada kWh, o que é chamado de pegada hídrica.
De acordo com a Waterfoot Print Network, produzir 1 kWh de eletricidade em uma usina de energia movida a carvão em média tem uma pegada hídrica azul -água extraída de rios e lagos- da ordem de 2,86 l/kWh e uma pegada hídrica cinza -água poluída em o processo que deve ser tratado- 616 l/kWh.
A extração do petróleo bruto, o refinamento e o transporte de 1 litro de combustível podem consumir cerca de 2,8 litros de água. Um carro moderno e eficiente pode ter uma pegada hídrica azul anual de 550 litros, ao percorrer cerca de 10.000 quilômetros.
Assim, as crises hídricas previstas devido à superexploração e contaminação das fontes naturais de água são também um potencial crise energética, portanto, avançar na redução do consumo de água dos processos energéticos é um imperativo de00 adaptação.
Fonte: Tratamento de Água